O direito a terra onde viveram seus antepassados é um direito garantido aos grupos de afrodescendentes que se auto-reconhecem e se autodenominam Remanescentes de Quilombos ou quilombolas. O direito aos remanescentes de quilombos a terra onde seus ancestrais viveram está garantido na Constituição federal de 1988 através do Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) diz que:
“Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os respectivos títulos.”
Atualmente, segundo dados da Fundação cultural Palmares, no Brasil atualmente existem mais de 1.500 comunidades espalhadas pelo território nacional certificadas pela Palmares estas comunidades se auto-reconhecem como Remanescentes de Quilombos, ou seja, se reconhecem enquanto descendentes de povos africanos escravizados e nos dias atuais ainda mantêm de alguma forma tradições culturais, de subsistência e religiosas de seus antepassados.
Em Mato Grosso segundo dados da Fundação Cultural Palmares há 65 comunidades “certificadas” (56 delas receberam a “certificação” em 2005) nos municípios de: Acorizal (2), Cuiabá (4), Chapada dos Guimarães (7), Barra do Bugres (4), Porto Estrela (1), Poconé (27), Cáceres (5), Vila Bela da Santíssima Trindade (6), Nossa Senhora do Livramento (7), Santo Antonio do Leverger (1), Várzea Grande (1). Em 2009 e 2010 apenas 02 comunidades foram certificadas.
A garantia do território ainda é o desafio maior para estas comunidades, porém, está longe de ser o único. A grande maioria dessas comunidades está desprovida de serviços básicos como: estradas, pontes, habitação e educação, o que dificulta a melhoria da qualidade de vida e a participação na economia local e economia regional. Muitas sequer sabem que a Constituição Federal desde 1988 lhes dão a garantia definitiva do território e que a União, estados e municípios devem tomar as providencias legais necessárias para que continuem ou voltem para as terras de seus antepassados.
Em Vila Bela da Santíssima Trindade – MT localizada no sudoeste do estado de Mato Grosso, minha cidade natal conhecida como a cidade com maior concentração de afrodescendentes do estado são seis (06) as comunidades certificadas pela Fundação Cultural Palmares: Bela Cor, Boqueirão (Vale do Rio Guaporé - Porto Bananal), Manga, Vale do Rio Alegre, Capão do Negro, Vale do Alegre ("Valentim e Martinho").
Atuando no Grupo de Trabalho Amazônico Regional Mato Grosso – Rede GTA acompanhei as “idas e vindas” do meu povo, lideranças quilombolas da Associação A Cor é Bela para conseguir a garantia do território e melhoria da qualidade de vida dos moradores da comunidade Boqueirão (Vale do Rio Guaporé - Porto Bananal). Foram inúmeras as reuniões com órgãos do Governo Federal como o INCRA e a própria Fundação Cultural Palmares para conseguirem a titulação definitiva da área e assegurar outros direitos fundamentais a qualidade de vida. Sem sucesso, apenas promessas e afirmações de que estão empenhados nesse propósito. Nunca deixaram de ser atendidos pelos dirigentes desses órgãos.
Através da associação, quilombolas que residiam na área e os que moravam na zona urbana do município de Vila Bela apenas almejavam conseguir obter juridicamente o direito de retornar a área que outrora pertencera a seus ancestrais, restabelecer antigos laços comunitários de união e assim poder além da conquista da cidadania e do respeito, resgatar valores culturais, sociais e econômicas a partir de antigas “práticas” que lhes asseguram e fortalecem a identidade étnica.
Criada em 1988 (mesmo ano da promulgação da Constituição), a Fundação Cultural Palmares é uma instituição pública vinculada ao Ministério da Cultura cuja finalidade é promover e preservar a cultura afro-brasileira. No caso das Comunidades Quilombolas sua função “é formalizar a existência destas comunidades, assessorá-las juridicamente e desenvolver projetos, programas e políticas públicas de acesso à cidadania”. No entanto está longe de cumprir com sua missão, as comunidades e a população quilombola do Brasil e MT continuam uma árdua luta pela garantia definitiva do território e o direito a cidadania.
*Deroní Mendes é geógrafa, filha de agricultores afrodescendentes de Vila Bela-MT e atua na coordenação do projeto de Formação de gestores Indígenas de Mato Grosso pelo Instituto Indígena Maiwu e escreveu especialmente para o JNMT.
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