Para além das queimadas e do desmatamento existe um sem número de povos e comunidades que buscam conciliar o desenvolvimento e a conservação da floresta. São modos de vidas tradicionais que entendem e respeitam o tempo da natureza. Também há a vivência de pequenos e médios agricultores que perceberam que a floresta em pé pode trazer muito mais benefícios do que derrubando as árvores para plantar pasto ou grãos em monocultivos.
Em Juína, no Noroeste de Mato Grosso, os agricultores Dirceu Dezan e Rubi Krindges apostaram na diversificação da lavoura e são referências na região. Dirceu, em uma área de três hectares planta chuchu, laranja, coco, banana, limão, cupuaçu. Também é possível encontrar vários pés de teca, entre outras espécies vegetais. Seu Rubi é conhecido Brasil afora pela qualidade do mel, guaraná e café que produz. Ambos possuem um padrão de vida similar a classe média dos centros urbanos.
Na cidade vizinha, em Brasnorte, os índios Rikbaktsa, que sempre foram defensores da floresta, produzem látex que é vendido para uma empresa de pneus. Também coletam castanha-do-Brasil que é vendida por um preço maior que a média de mercado devido aos cuidados desde a coleta até o armazenamento do produto. O Programa Integrado da Castanha – PIC, um componente do Projeto de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade nas Florestas de Fronteira do Noroeste de Mato Grosso, executado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (SEMA) foi um dos responsáveis em ajudar nessa qualificação dos indígenas.
Um dos compradores da castanha dos Rikbaktsa é a Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhecer (COOPAVAM), em Juruena, que deverá terminar 2011 produzindo cerca de 90 toneladas de castanha em amêndoas. A partir uma fábrica instalada no assentamento em 2008, eles já vendem para várias empresas de alimentos e uma importante empresa de cosméticos. Com o apoio do projeto Poço de Carbono Juruena, patrocinado pelo Programa Petrobras Ambiental, no mesmo assentamento foi criada a Associação de Mulheres Cantinho da Amazônia (AMCA) cujos biscoitos produzidos pelas mulheres são distribuídos na merenda escolar de seis municípios da região Noroeste, via Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), da Conab.
Em Porto Velho (RO) e em muitos outros lugares da Amazônia Legal é possível encontrar várias unidades de Produção Agroecológica Integrada Sustentada (PAIS), uma técnica divulgada pela Fundação Banco do Brasil (FBB) e outros parceiros institucionais voltada para segurança alimentar das comunidades. Atualmente já são mais de oito mil unidades dessas em 19 estados brasileiros. Cada unidade do PAIS permite a criação de aves, hortas e um pequeno sistema agroflorestal com irrigação por gotejamento e adubação orgânica.
Estes são apenas alguns exemplos que tive a oportunidade de conhecer ou visitar este ano. Centenas de outras iniciativas como estas estão na Amazônia, com maior ou menor grau de envolvimento das comunidades e recursos de empresas e governos. Mas também há muitos exemplos onde mesmo sem apoios externos os povos se desenvolvem. Francisco de Souza, de uma comunidade quilombola do município de Oriximiná (PA), faz parte de uma cooperativa que coleta e vende castanhas em casca. A produção poderia ser muito maior se houvesse um mínimo de recurso do poder público para abrir algumas picadas na floresta e se os cooperados tivessem barcos e motos para poderem buscar os ouriços nas castanheiras ainda inatingíveis para eles na sua comunidade.
Francisco, com sua simplicidade, visitou no início deste mês algumas experiências em Mato Grosso e lamentou um fato que nos faz pensar: “Porque se investe mais onde o desmatamento já está adiantado e ignoram onde a floresta está em pé?” Se isso fosse uma verdade completa, daria pra dizer que os governos estaduais e federal precisariam apenas calibrar o foco de seus investimentos.
Infelizmente, apesar de tantos exemplos bem sucedidos, o apoio ainda é ínfimo, quase nulo, se comparado ao que se é investido na pecuária e nos grandes monocultivos. Exemplos que a floresta em pé dá dinheiro e que as comunidades sabem viver com ela existem em vários lugares.
O que falta é o governo priorizar a floresta ao invés do desmatamento.
*André Alves é jornalista em Mato Grosso e especialista em Antropologia
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